eu já quis você.
eu já gostei de você, você e sua vermelhidão, você e seus sorrisos que já significaram mais do que só sorrisos, mais do que dorzinhas agudas no meu coração, mais do que uma sabotagem a mim mesma. eu já gostei de você e dos nós dos seus dedos que eu pensei que devia beijar e amar, e das suas mãos, da sua pele, das suas sobrancelhas; eu gostei de você do jeito que eu achei que deveria gostar de uma pessoa que precisa de amor, de suavidade. eu gostei de você com todo o meu coração e eu chorava nos ônibus por pensar no quanto eu gostava de você, eu chorava de saudade.
eu já quis você.
eu já quis você. é estranho, não é? eu já quis você, e eu te disse que eu nunca queria acabar, que eu queria que a gente fosse infinita. eu não quero mais ser infinita. você me machucou — você me machucou de propósito, você me machucou de um jeito que doeu, você me tirou as lembranças boas que eu queria manter e as transformou em imagens de você com outras pessoas. que eu também perdi. e vai que eu não devo falar nada disso, porque eu também te magoei, não magoei? eu não sei se quero, nunca mais, ouvir que estou certa. eu não quero ter um modus operandi e eu não quero ferir, eu não quero mais tentar coisas que eu não consigo fazer. eu não queria magoar, mas eu sei que magoei. eu nunca queria acabar porque eu achei que mesmo as mágoas tivessem cura, que tudo ia dar certo — por que você me magoou assim? por que você disse que foi logo depois de eu me sentir daquele jeito? como você ia me contar comigo aí? eu não sei qual seria a minha reação. talvez tenha sido melhor assim, e eu não sei, porque não é melhor. nada disso consegue se encaixar em qualquer coisa como "melhor".
por quê? eu sei que você já me quis. por que você disse isso pra me machucar? a minha cabeça não funciona do jeito que deveria, eu sei que cansa, eu sei que é desesperador gostar de alguém quando essa pessoa não consegue colocar esse fato na mente — mas depois daquilo, não me diga que você gostava de mim. você não gostava de mim mais como eu gostava de você, e tudo bem, porque você não precisava me amar. você nunca precisou me amar. por que você me fez pensar que tudo podia ficar bem? talvez eu devesse ter enxergado nas frases que ficavam na minha cabeça, talvez você as tenha dito para que ficassem, mesmo. sobre estar ruim demais. sobre não dar pra melhorar. eu devia ter entendido que você não gostava mais de mim daquele jeito e que o que eu estava passando era coisa demais para dividir entre duas pessoas, como quando você despeja o leite em uma caneca mas espirra demais, espirra demais. e tudo fica sujo.
talvez eu devesse ter entendido que não era pra ser do jeito que eu achei que podia. eu sou muito irrealista — não surrealista, porque eu quero coisas que não podem mesmo acontecer, e não o surreal. eu queria que tudo ficasse bem, por que não pôde ficar bem? acho que não dava mais pra ser, eu te disse, eu gosto de você do jeito como se gosta e dói, porque é grande. quando foi que essa dor se tornou ruim? quando foi que as brigas aconteceram, quando foi que o carinho diminuiu, quando foi que você parou de se sentir confortável pra me dizer algumas coisas? quando foi que eu errei, o que eu fiz, o que eu pensei pra perder sua confiança? questões de coisas que aconteceram, e não hipóteses; e por isso mesmo, coisas que eu não posso mudar. eu não posso voltar no tempo.
irreal.
eu já quis você. eu amei você tanto que doía — a saudade doía, o amor doía, a felicidade doía, meu rosto doía de tanto sorrir. eu já quis você mais do que eu já quis muita coisa na minha vida e eu sei que foi de verdade, o que aconteceu, mas não dá mais pra me lembrar, porque eu apaguei as mensagens mas as palavras continuam vindo na minha cabeça, pra me machucar. nomes. fatos. mais coisas imutáveis, mais coisas que aconteceram e só me resta, só nos resta aceitar. eu já quis você, e eu sempre quis você bem, eu só não achei que um dia ia te querer bem mas bem longe, também; eu já amei você e eu não achei que um dia ia pensar que só queria que não. eu já sonhei com você e não acordei e levei alguns instantes pra perceber que sonhos assim são ruins, eu já olhei fotos suas sem pensar que eu não conheço mais a pessoa naquela foto, porque não sei, algo quebrou. alguma coisa quebrou, não em nós, mas entre nós, algo quebrou no modo como a gente se tratava e a gente se via e a gente se sentia. eu não acho mesmo que havia mais carinho, agora que eu penso bem; você parecia cansada. e eu li meus textos e eles todos falam de ter tanto medo e de estar tão cansada e, ao mesmo tempo, ter tanto medo de cansar.
eu não queria cansar. e eu também não queria me sentir assim. eu não quero ouvir algumas coisas, olha só — eu não quero ouvir que é algo ruim eu não te chamar quando eu estou mal, eu também não quero ouvir que eu estou certa, eu também não quero ouvir as últimas coisas que você me disse. eu viajo em breve e tenho medo de encontrar você por aí, que infortúnio agora estar mais perto. eu não quero ver mais o seu rosto porque meu medo se tornou realidade e eu não conheço mais, eu vejo fotos e eu não conheço mais, eu investigo suas palavras e eu não te conheço mais. eu não penso mais tanto em morte (e no quão fracassada eu me sinto por pensar isso por razões de amor), eu tento ficar bem porque eu acho que mereço ficar bem. eu fiquei com raiva; eu peguei todas as suas cartas, todos os desenhos, tudo o que você me escreveu, e joguei fora. eu te tirei de todo lugar, porque não quero correr o risco de te encontrar de surpresa, eu não quero lidar com ainda me importar com você. eu fiquei com raiva e eu quero que você vá embora da minha vida. talvez seja mesmo eu — quem expulsa todas as pessoas da minha própria vida. faz sentido, não faz? e agora eu também me afasto de outras pessoas, porque eu não quero correr o risco de esbarrar com você na internet de novo. mas eu sei que a internet é rande demais e isso pode acontecer e provavelmente vai acontecer, mas eu não quero.
eu. não. quero.
e do mesmo jeito que suas conversas não iam embora, do mesmo jeito que você continuava a falar, do mesmo jeito que eu não conseguia apagar aquilo que você tinha dito — e deus sabe o quanto eu evitei aquela conversa que não sumia, porque ela ficou como um lembrete de coisas ruins por tanto tempo —, desse mesmo jeito eu não quero mais te encontrar, porque volta e volta e volta e a verdade é que eu te amo, mas eu não consigo amar você. eu não quero mais beijar os nós dos seus dedos, eu não quero mais acariciar a sua pele, eu não quero mais ver seus olhos fechados. eu não quero segurar a sua mão. eu não quero ouvir a sua voz, e eu não quero ler mais hahaha e eu não quero mais desanimar, eu não quero, só não quero. eu não quero me sentir culpada assim.
eu já quis você, meu bem. você já foi meu bem. você já foi meu amor, você já foi tantas coisas que eu não posso dizer todas, são coisas demais. você já foi minha melhor amiga, você já foi a pessoa que dormia comigo e a pessoa pela qual eu acordava cedo, só pra conversar antes da sua aula. eu já quis você porque você é tão vermelha e radiante e você me ensinou a gostar mais de mim, e agora eu penso que eu espero ter conseguido ensinar você a gostar mais de si mesma. eu não te odeio, eu não consigo te odiar. eu tenho raiva. eu queria saber o que deu errado, mas não adianta, né?
eu já quis você. eu já reconheci você, também. mas mal posso esperar que você seja outra vez só uma pessoa no meio das outras que passam pela gente na rua.