26.6.20

healing ritual — whatever, dad

eu acho que não sou normal o suficiente.

também não sou especial o suficiente — começo meus parágrafos com o pensamento de que eles não são como deveriam, e minha vida segue o mesmo fluxo, em que eu sempre penso que sou algo, mas não como devia; não especial o suficiente, não dedicada o suficiente, nunca o suficiente.

quando eu estava na sétima série, talvez na sexta, me lembro de pensar que queria sair do meio do caminho; ser mais branca ou ser mais preta. literalmente; até a indecisão do meu tom de pele me atormentava, o meu eterno meio-do-caminho. por toda a minha vida eu me pego começando e parando projetos que mais tarde se tornam projetos de alguém que teve ideia parecida e levou pra frente, e assim posso encarar meu fracasso em forma de sucesso alheio. dói ser ressentida; dói não me achar o suficiente.

dói. e eu, se for sincera, não sei por que dói — não sei por que não continuo, não sei porque não ajo, não sei por que não paro. é como se eu seguisse, e seguisse, e seguisse, mas continuo no meio do caminho. talvez porque não exista um fim e essa é só uma história que contamos a nós mesmos para que seja mais fácil continuar; para que os pés se cansem mas a mente insista, e então, quando chega o fim, ele é apenas o fim, e não há nada depois dele. tudo o que é meu se permeia com incerteza e a semente da indecisão plantada a muitas mãos no meu coração me faz questionar como será, como foi, como seria; a memória ruim colabora, e compartilha lembranças que não sei se são reais ou inventadas: palavras, sentimentos, felicidade tristeza raiva alegria. queria dizer que sei com certeza quem eu sou e quem fui e o que sinto e o que senti, mas me é um mistério.

talvez seja isso que as pessoas querem dizer quando te dizem para não se apegar ao passado; talvez queiram dizer que não podemos ter controle, que já passou e por isso não vale a pena se agarrar como uma certeza. mas se não há certeza no passado, onde há? talvez seja uma lição: se lembre de quem você é, mas nunca de quem você foi. se você é o fruto de todas as pessoas que você veio sendo, não deve ser tão difícil.

mas é, e é por isso que me pergunto se essa é a forma mais certa de se fazer alguma coisa. qualquer coisa. sinto que cada decisão pode ser certa ou errada enquanto digo a alguém que não há decisões erradas, e me desacredito a cada palavra, porque nunca foi tão fácil desacreditar em mim. talvez eu seja uma grande mentira, mas só o que basta é continuar me enganando.

afinal, o meio do caminho se mantém enquanto tivermos esperança de que chega em breve o fim. e o que é isso, senão uma grande enganação, monumental, engenhosamente planejada?