25.3.19

amandinha não

se eu fosse contar pra outra pessoa, diria que ela é grande, quando se vê.
(foi a primeira coisa que ela me disse, às vésperas, quando uma ainda não sabia a reação da outra, quando as duas tinham medo de não ser o que se esperava. mas o que, exatamente, se esperava?, e como é que se devia ser, se não fosse exatamente do jeito que era?, mas isso não é sobre mim, então pulemos esse questionamento)
primeiro, porque realmente, ela é grande. é maior do que eu, certamente, por mais que eu implique, brincando, que nem é tanto assim — mas é um pouco que dá a sensação de muito, por algum motivo; vai ver, quando se é uma pessoa como ela, a gente só parece maior, mesmo. imponente.
segundo, porque eu senti que ela me disse isso na esperança de me avisar sobre algo, como quando a gente vai almoçar na casa de alguém e dá um jeito de estrategicamente enfiar no meio de uma conversa, dois dias antes, que não come alguma coisa. "ah, sabe como é, né, ontem eu mordi uma cebola sem querer...", e a outra pessoa vai pensar: putz, cebola. não posso fazer nada com cebola no almoço. eu não tenho como saber — muita coisa a gente não tem como saber exatamente, é tudo uma enorme adivinhação disso e daquilo —, mas foi o que me pareceu, porque é algo que eu faço muito. fazia? faço? bom, o ponto é que eu conheço o jeito de quem faz isso, também, e quando eu gosto de alguém, tenho essa mania de enfiar assuntos sensíveis no meio das conversas.
"quem é que quer se sentir questionado na intenção alheia de se sentir bem depois?", você me pergunta. eu não sei. acho que não é algo que as pessoas esperam (certamente não é algo que elas querem), mas é bom de fazer. tira um pouco a coisa do eixo errado, e coloca no certo. se ela me disse aquilo de um jeito depreciativo (ou levemente depreciativo) (ou mesmo não-depreciativo, vai saber), eu vou usar de uma maneira totalmente contrária, e vai se tornar algo bom. é assim que eu penso.
enfim. enfim. grande. eu me perco demais, pensando sobre isso; me pergunto se também tem algo a ver com ela, ou se é só uma coincidência. um pouco dos dois, talvez. ela é grande porque é alta, é grande porque é larga, e é essa a imagem que vem imediatamente na minha cabeça quando eu penso nela: grande. como ela apontou. aponta, na verdade — e nem todas as vezes de uma forma que me soa estranha, eu confesso. o que pode ser só coisa da minha cabeça, mas de todo jeito é válido. é válido? ah, vai saber.
ela é grande por outras coisas, também, coisas sobre as quais eu sempre penso. grande porque o abraço dela é o melhor dentro do qual eu já pude me perder. grande porque o sorriso dela é tão bonito que eu nem sei mais onde eu tô. grande porque o som da risada dela me dá vontade de rir e eu nem preciso ter entendido a piada. e se dá pra se perder, se eu não sei onde eu tô, se faz rir até doer a barriga, é grande, né? é esse o conceito, eu diria. falando de sorriso e risada, eu penso em como o rosto dela é enorme, de olhos fechados — dá pra traçar todas as linhas que um rosto precisa ter, tem espaço pra guardar muita coisa, ali. um segredo. um beijo. vários beijos. uma lembrança, pra quando for preciso. uma pinta, só pra não perder o costume. uma cicatriz pra lembrar da infância. um nariz pra dar risada quando se aperta. bochechas macias, pra quando for preciso um cochilo. sobrancelhas engraçadas porque não são como nenhuma outra que eu tenha visto, e dão muito certo. uma boca bonita de sentir sorrir. viu? um monte de coisas. se cabe um monte de coisas, por definição, é grande.
e aí eu posso descer. eu não diria ombros largos (o que me atrapalha um pouco nesse lance de "grande", se você quer saber), mas na proporção, você poderia dizer que é grande. dá pra descansar ali, depois de chorar um bocado. dá pra buscar um tanto de alento. dá pra se sentir em casa — não dá pra negar que a sensação de estar em casa é algo grande. e não só consolo, dá pra se sentir bem genuinamente ali, sem nenhum contexto anterior; um dia bom, quando eu chego em casa e a gente deita na cama, eu descanso a cabeça no ombro dela, vira um dia melhor. é grande porque dá pra contar uma história, ali, de um dia, dois, às vezes até três. uma história temporária, mas dá. uma história contada no calor do momento e que assusta depois, mas que faz dar risada. cabe sentimento demais, é grande. eu diria grande porque cabe um cardume de sardinhas ali, e é mar aberto, e mar aberto é grande. enorme.
ela é macia. pessoas macias têm algo que não dá pra explicar, mas que as torna mais alguma coisa do que as outras. não mais no sentido de acima, só mais no sentido de... mais. mais confortáveis, mais atrativas — como quando você precisa levantar, mas a cama é boa demais, e te abraça de um jeito que não dá pra soltar. irrestistível, eu diria. eu diria que tem algo sobre estruturas quando você olha pra ela (- gal costa.mp3), algo sobre a curva das costelas e sobre como ela parece... não uma casa, não um prédio (ela é fácil, então definitivamente não um edifício), mas algo ligado a arquitetura: planejamento e encaixes e curvas, e sensações e algo sobre contar histórias, algo sobre familiaridade e se sentir feliz. não uma casa, não um prédio, mais. imponente, mas gentil. grandioso.
e talvez também grande como em grandes risadas e grandes sustos e fechar os olhos e caminhar de mãos dadas, grande como em uma cidade grande, grande como o céu aberto numa cidade do interior, grande como o som num festival de música e grande como um estacionamento e como o vento batendo no seu rosto quando se anda de bicicleta. como em sentimentos grandiosos — a gente não precisa ser sempre tão literal. ela não é tão literal; talvez eu devesse incluir isso na lista.
ela é grande, mas às vezes não.
às vezes, dá pra trazer pra perto e guardar perto do peito, como se fosse um passarinho. às vezes dá pra derrubar só com um sopro, só com um toque, só com uma palavra — o que não é grande, exatamente, mas não deixa de ser. às vezes é uma risada que mostra que ela não é intimidadora, só grande. às vezes é só que ela não é exatamente inha, mas não deixa de ser, um pouco. às vezes ela sorri e você entende que nada é exatamente o que você espera que seja, porque tudo se confunde e ela é enorme, mas você sente que vai explodir, e é tudo demais, e é aí que tá. ela chega e você põe os olhos nela e ela é grande, nunca vai deixar de ser.
(só que em mais maneiras do que ela consegue perceber, só isso)